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Farelo de soja e milho do Brasil ganham mais espaço na China enquanto Nancy Pelosi desembarca em Taiwan

Nancy Pelosi desembarca no Sungshan Airport, em Taipei Foto: Ministro das Relações Exteriores de Taiwan

Enquanto o avião da presidente da Câmara dos Deputados dos EUA, Nancy Pelosi, chega à Taiwan, o farelo de soja do Brasil deverá chegar à China nas próximas semanas, encurtando ainda mais as relações entre chineses e brasileiros. Esta semana começa com foco sobre ambas as notícias, já que elas estão bastante relacionadas. Afinal, a ida de Pelosi tem sido condenada pela China e tida pelo presidente chinês como um “caminho sem volta”, o que faz analistas e consultores de mercado a alertarem para um descompasso ainda mais profundo na relação entre as duas maiores economias do mundo e impactar na demanda chinesa pelos grãos e subprodutos americanos.

“As exportações deste subproduto do Brasil para a China deverão ser intensificadas caso este conflito entre Taiwan e China também se intensifique, porque o lado norte-americano tem se mostrado um grande apoiador de Taiwan e a China, na contrapartida, já declarou que se houver interfêrência norte-americana nesta questão haverá consequências. Consequências que podem ser ‘simples’ retaliações comerciais já observadas desde 2018 ou até medidas mais duras, geopolíticas”, explica o diretor da Pátria Agronegócios, Matheus Pereira.

Assim, caso essas retaliações comerciais sejam efetivadas, o Brasil já estaria garantido como importante fornecedor de farelo para a China, podendo se tornar a principal origem do derivado para a nação asiática. Mais do que o farelo, o processo das importações de milho pela China poderia ser intensificado.

“Lembrando que o segundo maior consumo da soja brasileira se dá no mercado doméstico, ou seja, no esmagamento. Porém, metada do farelo já é exportado e com um adicional do comprador chinês teríamos mais do nosso grão não sendo só exportado in natura, mas processado e embarcado com direção à China. Isso é uma grande medida que se alinhou com os atuais interesses chineses, que têm tido muitas tensões com os americanos, e poderá concentrar mais ainda a demanda da China pelos nossos produtos, não só in natura, mas também derivados”, afirma Pereira.

Todavia, o mercado observa também o imposto sobre a importação de farelo pelo governo chinês que é de 9%, enquanto para o grão é de apenas 1%, o que acaba limitando a competitividade do subproduto importado.

“Apesar de permitir a importação de farelo do Brasil, o VAT (imposto sobre a importação) inibirá qualquer competitividade exterior com as indústrias locais”, acredita senior risk manager da hEDGE Point Global Markets,  Victor Martins. “Esse mesmo movimento foi realizado em 2018, quando a China abriu espaço para a exportação de farelo da Argentina, que hoje é a principal origem exportadora de farelo do mundo, exportando mais de 50% do volume global”.

E Martins lembra ainda que, apesar do acordo, a Argentina nunca embarcou, de fato, farelo de soja para a China.

MILHO E FARELO DO BRASIL X NANCY PELOSI

Embora as notícias sobre o farelo brasileiro podendo chegar à China em cerca de duas semanas, como declarou o ministro da Agricultura, Marcos Montes, em um evento nesta semana, tenham se intensificado, o paradoxo da viagem da parlamentar americana com a demanda chinesa pelos produtos dos EUA é ainda mais forte.

“É muito mais substantivo este paradoxo para o milho do que para farelo. A China é a maior produtora de farelo do mundo e não é deficitária em farelo, mas em soja grão e em milho. Inclusive, fechou um pacto com a Argentina em 2018 e não foi relevante. E se, em algum cenário, a China precisar importar farelo, será algo muito pontual, e que não conseguirá competir com o mercado local porque isso tornaria as margens de esmagamento negativas”, explica o senior risk manager.

Com isso, ele afirma ainda que o que poderia ser importado pela nação asiática de farelo brasileiro seria insuficiente para impactar a balança brasileira e os resultados. Com uma produção nacional de cerca de 34 milhões de toneladas do derivado, 50% se destina à exportação e 50% para o mercado interno. Assim, “deste montante que iria para a China não aumentaria nem 20% o volume que seria exportado de farelo pelo Brasil. Já há um destino ‘muito interno’ e não se consegue dobrar a capacidade de esmagamento de uma indústria só porque a China está comprando”, diz o analista de mercado.

Ainda assim, a abertura do mercado do gigante asiático para o produto brasileiro é uma conquista importante e uma sinalização política também relevante para o atual momento das relações China x EUA.  “O farelo brasileiro chegando à China foi um grande feito do lobby feito pelo governo brasileiro, que tem sempre lutado pela nossa classe”, afirma Matheus Pereira.

Para Eduardo Vanin, analista de mercado da Agrinvest Commodities, as relações comerciais entre os dois gigantes poderiam, de fato, voltar a ficar bastante comprometidas, o que faria essas possibilidades para o farelo serem ainda mais uma abertura de portas para o milho brasileiro. A análise é compartilhada pelo consultor de mercado Vlamir Brandalizze, da Brandalizze Consulting, que projeta as compras chinesas no ano que vem entre 25 e 30 milhões de toneladas do grão.

Segundo ele, o cereal brasileiro já poderia começar a ser embarcado para a nação asiática já a partir de outubro. “E é importante começarmos a exportar esse milho a partir de outubro porque a partir de dezembro eles começam a puxar milho dos EUA que já compraram da safra que esta, então teremos uma janela de outubro a dezembro boa para embarcar muito milho para a China”, acredita o consultor. E todo o processo poderia se intensificar diante desta crise política entre China e Estados Unidos.

Ao pousar em território taiwanês, Pelosi emitiu um comunicado dizendo que “a visita de nossa delegação do Congresso a Taiwan honra o compromisso inabalável dos Estados Unidos em apoiar a vibrante democracia de Taiwan”,  Do mesmo modo, como informaram agências internacionais de notícias, a China teria anunciado a realização de testes de mísseis a partir da noite desta terça, além de Pequim ter anunciado, entre 4 e 7 de agosto, exercícios militares ao redor da ilha.

O mapa abaixo, divulgado pela Xinhua, agência estatal de notícias da China, mostra – nos retângulos vermelhos – onde serão realizados os exercícios.

Logo na sequência do pouso de Pelosi, o Ministério das Relações Exteriores da China emitiu um comunicado dizendo: ““A China tomará todas as medidas necessárias para defender resolutamente a soberania nacional e a integridade territorial, e todas as consequências devem nascer dos EUA e das forças de independência de Taiwan”.

Ainda segundo Vanin, a figura de Nancy Pelosi “não é bem quista na China, que carrega o movimento pró-democracia e isso fere a questão do poder do Partido Comunista da China”, diante de ações já realizadas por ela, como um encontro com o Dalai Lama, no Tibet, que também vai contra a soberania da China.

Fonte: Notícias Agrícolas